Evento internacional promovido pela Enamat apresenta resultados de pesquisa que busca compreender sistema judicial em países de diferentes continentes
Teve início, nesta terça-feira (28), o Seminário Internacional Sistemas de Jurisdição Trabalhista: Pesquisa e Integração, evento que marca a consolidação de um amplo trabalho, iniciado em 2019, de análise descritiva comparativa sobre a jurisdição trabalhista em diferentes países: Brasil, México, Argentina, Coréia do Sul, África do Sul e Portugal. Além da apresentação dos resultados da pesquisa, o evento também busca fomentar a integração do Brasil com as demais nações.
O seminário, que ocorre até esta quarta-feira (29), é promovido pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho (Enamat). A instituição desenvolveu a pesquisa por meio de uma cooperação técnica internacional com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), com o Centro Internacional para Políticas de Crescimento Inclusivo (International Policy Centre for Inclusive Growth – IPC-IG) e com a Agência Brasileira de Cooperação (ABC).
Abertura
Na abertura oficial do evento, o presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), ministro Emmanoel Pereira, destacou a relevância da iniciativa para o aperfeiçoamento da Justiça do Trabalho no Brasil. “O objetivo é o compartilhamento de experiências, seja na gestão de processos e procedimentos, seja no domínio das condições de acesso à Justiça na esfera trabalhista, no âmbito de diferentes contextos sociojurídicos. Esse projeto de cooperação muito tem enriquecido o conjunto de ações da Enamat na formação, no aprimoramento e na atualização jurídica de magistrados”, salientou.
O diretor da Escola Nacional da Magistratura, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, esclareceu que os países participantes do levantamento foram escolhidos por seu nível de desenvolvimento econômico intermediário ou alto e por possuírem leis trabalhistas com grau de proteção ao trabalhador elevado ou moderado. Segundo ele, o Direito Comparado dá ferramentas para “vermos com outros olhos a nossa atuação, e podermos receber boas experiências e boas práticas de outros países para tentarmos aplicar aqui e também para tentarmos avaliar a nossa situação no contexto mundial, compreendendo em que lugar estamos no cenário do planeta”.
Conferência magna
A conferência magna, presidida pelo ministro Aloysio Corrêa da Veiga, contou com a exposição da ministra do TST Morgana de Almeida Richa. Ela apresentou a evolução histórica e um retrato atual da legislação e da Justiça Trabalhista no Brasil. A ministra também pontuou desafios futuros a serem enfrentados pelo Poder Judiciário no que tange à resolução de conflitos e à garantia de direitos na esfera trabalhista. Citou, nesse sentido, o avanço tecnológico que vem transformando as relações de trabalho, trazendo como exemplos as plataformas digitais (com as quais mais de 1,4 milhão de trabalhadores brasileiros estão ligados, atualmente), inteligência artificial e aprendizado de máquina. “Esse tempo futuro é uma grande interrogação. O que será construído dependerá muito das configurações das linhas éticas, das leis de proteção de dados, da percepção da sociedade e de que limites vai se dar, o que será feito dessas plataformas, como será a regulamentação. Por certo, a Justiça do Trabalho no Brasil e no mundo têm um importante papel a cumprir”, disse Morgana Richa.
Ela também exaltou os resultados do trabalho de pesquisa comparada que, segundo a ministra, darão bases sólidas para a interlocução nos debates acerca da Justiça Trabalhista brasileira.
Argentina
Diferentemente do Brasil, a Argentina não possui um sistema judicial trabalhista centralizado: há um total de 24 Justiças Trabalhistas e 24 ordenamentos processuais trabalhistas distintos e independentes – um em cada província e na Cidade Autônoma de Buenos Aires. A Justiça Federal atua, de forma residual, quando um dos sujeitos em matéria trabalhista é o Estado Nacional ou repartições nacionais. Em última instância, a Corte Suprema de Justiça é acionada em caso de violações a normas constitucionais.
A apresentação foi feita por Carlos Toselli, professor da Universidade Nacional de Córdoba, que esclareceu especificidades da regulação e do processo trabalhista nessa província. Ele destacou os desafios vivenciados pelos juízes e o esforço para enfrentamento à morosidade das ações. Segundo o professor, a reforma mais recente do processo do trabalho na província, em 2018, buscou solucionar atrasos que superavam quatro anos na conclusão das ações.
Quanto à estrutura, a Justiça do Trabalho de Córdoba conta com Juízes de Conciliação e Trabalho, a quem cabe a busca por conciliação em todas as causas e o julgamento daquelas de menor complexidade; as câmaras do trabalho, por sua vez, atuam como instância de apelação ou instância originária instrutória e decisória para casos de maior complexidade; e o Superior Tribunal de Justiça é acionado em recursos de cassação e de inconstitucionalidade.
A mesa foi presidida pelo ministro Breno Medeiros, diretor do Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Assessores e Servidores do TST (Cefast).
México
Na mesa presidida pela ministra Dora Maria da Costa, vice-presidente do TST e do CSJT, o palestrante Luis Gerardo de La Peña Gutiérrez apresentou o funcionamento da Justiça do Trabalho mexicana após as profundas mudanças constitucionais promovidas em 2017. Segundo Gutiérrez, que é mestre em Direito Constitucional e do Trabalho, a reforma constitucional veio para modernizar a Justiça do Trabalho de seu país.”Sem dúvida foi a mais importante das reformas constitucionais dos últimos 100 anos no México”, afirmou.
Antes das mudanças, o sistema judicial trabalhista mexicano era caracterizado pelo tripartismo e por pertencer ao Poder Executivo. Gutiérrez destacou o papel das Juntas de Conciliação e Arbitragem, que faziam parte do Executivo e possuíam estrutura tripartite, o que permitia a representantes sindicais influírem nas decisões. A reforma determinou que a Justiça do Trabalho fosse deslocada ao Poder Judiciário, com autonomia e que seria aplicada por tribunais trabalhistas locais e federais.
Um ponto em comum com a estrutura brasileira diz respeito à conciliação trabalhista. No México, ela é realizada pelos centros de conciliação federais e locais, especializados e imparciais, com autonomia plena. Há também preferência pela conciliação em qualquer situação. Todos os litígios trabalhistas são objeto de uma audiência obrigatória de conciliação antes do ingresso das ações trabalhistas.
Portugal
O ministro Caputo Bastos presidiu a última mesa do dia, com o tema “Sistemas de Solução de Conflitos Trabalhistas em Portugal”. O palestrante, Viriato Gonçalves Reis, procurador-geral-adjunto do Ministério Público de Portugal, apresentou aspectos gerais da organização judiciária portuguesa. São muitos pontos em comum com o ordenamento brasileiro, tais como juízes singulares em primeira instância, os Tribunais da Relação, em segunda instância, e o Supremo Tribunal de Justiça como instância superior e final.
Há também a fiscalização das condições de trabalho pela Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT). Esse órgão é o responsável por lavrar autos de advertência e aplicar sanções pecuniárias aos infratores, conhecidas em Portugal pelo nome de “coima”. Segundo Viriato, a inspeção do trabalho é uma atividade fundamental na estrutura de justiça. “Há convenções internacionais da OIT que garantem a existência de uma inspeção do trabalho autônoma”, observou.
Também em Portugal, há a valorização prioritária do ato conciliatório. A lei obriga uma tentativa obrigatória de conciliação em diversas fases do processo comum, nos procedimentos cautelares e na generalidade dos processos especiais. Em qualquer momento da causa, o juiz pode remeter as partes para a mediação, salvo quando alguma parte se opuser. Além disso, o Ministério Público português pode, antes da instauração da ação judicial, promover uma conciliação extrajudicial. Caso haja acordo, este tem poder de título executivo específico (CPT).
(NP/RT)