Trabalho escravo continua sendo uma realidade no Brasil
O combate ao trabalho escravo foi a temática de aula de instrução processual ministrada na manhã dessa quinta-feira (15) no 24º Curso Nacional de Formação Inicial (CNFI) promovido pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho (Enamat). A mesa foi composta pelo juiz do trabalho e conselheiro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) Francisco Luciano Frota, pelo presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Guilherme Guimarães Feliciano, e pelo juiz Marcus Barberino, do Tribunal Regional do Trabalho da 15º Região (Campinas/SP).
Chaga social
Segundo o conselheiro Luciano Frota, a inclusão do tema no curso de formação inicial atendeu a solicitação do Fórum Nacional de Combate ao Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas do CNJ. Num momento de profunda em tempo de tanta reestruturação da cadeia produtiva e de flexibilização das normas do trabalho, Frota considera importante que os novos juízes tenham contato com essa realidade.
“Trazer esse assunto para discussão é uma forma de sensibilizar os magistrados, pois o trabalho escravo continua sendo uma realidade, muito em decorrência do afrouxamento dos mecanismos de proteção ao trabalho”, assinalou. “O trabalho escravo é uma das formas mais aviltante da dignidade humana, e o juiz do trabalho tem uma responsabilidade imensa em seu campo de atuação em tentar coibir essa chaga social”.
Inteligência artificial
Somente em 1995 o Brasil reconheceu oficialmente a existência do trabalho escravo e deu início à implementação de políticas públicas voltadas para o assunto. Entre elas estava a criação do cadastro nacional de empregadores que exploram o trabalho escravo, que ficou conhecido como “lista suja”.
De acordo com o presidente da Anamatra, Guilherme Feliciano, o combate à prática tem contado, atualmente, também com o uso da tecnologia de ponta. “As novas tecnologias, como a inteligência artificial, podem auxiliar, e muito, no combate ao trabalho escravo”, afirmou. “Essas ferramentas precisam ser apresentadas ao juiz do trabalho, que vai se deparar com essas situações tanto no meio urbano quanto no rural”. Para Feliciano, o juiz que está preparado para combater o trabalho escravo “é um juiz preparado para qualquer questão laboral”.
Experiências
Em sua exposição, o juiz Marcus Barberino trouxe para o debate o relato de experiências vividas por juízes que se depararam com situações de trabalho escravo e como eles solucionaram os problemas materiais e processuais que encontraram. O objetivo foi mostrar que não se pode criar uma zona de conforto e simplesmente aplicar a lei. “É preciso que o magistrado entenda que cada caso será único. Julgar um processo que envolva trabalho escravo requer conhecimento interdisciplinar e estabilidade emocional profunda, e nenhuma experiência anterior vai dar conta do caso concreto”, assinalou.
Segundo o juiz, é preciso ter um olhar distinto para enxergar os problemas estruturais ocultos por certos fragmentos da realidade. “O trabalho escravo é um sintoma grave do mercado de trabalho, mas isso não transforma todos os trabalhadores em escravos, nem os empregadores em escravistas. Somos uma sociedade livre e temos que defender isso diariamente”.
Na parte da tarde, os trabalhos tiveram continuidade com uma oficina sobre gestão e decisão de casos de trabalho escravo, coordenada pelos juízes Guilherme Feliciano e Marcus Barberino.
(AS/CF)